domingo, 29 de agosto de 2010

QUEM ERA RENATO CARDOSO?

QUEM ERA RENATO CARDOSO?



Dr. Renato Cardoso
Assassinado em Quebra Canela
Cidade da Praia em 29 de Setembro de 1989
                                            




Renato de Silos Cardoso era natural do Mindelo, onde nasceu em 1 de Dezembro de 1951.

Um menino de S. Vicente, como tantos outros que nascem no aconchego de um lar humilde - mas, como o outro menino na manjedoura, banhado pelas bênçãos de um Céu por vezes atento e generoso. Ele era um eleito do Céu.

Renato de Silos Cardoso fez os estudos secundários no Liceu Gil Eanes, em S. Vicente.

Licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa, fez estudos de Direito Internacional na Academia de Direito Internacional de Haia - Holanda e de Administração no National Training Laboratories nos Estados Unidos da América.



A influência religiosa de cariz protestante, pouco detectável na aparência do pensamento e comportamento de Renato Cardoso, foi porém muito profunda. Renato Cardoso era um conhecedor profundo da Bíblia, do pensamento religioso do protestantismo, na sua vertente nazarena, em cuja comunidade conviveu e praticou na sua juventude. É da influência religiosa e não da ideologia socialista / marxista que resulta o seu posicionamento como político de uma verdadeira esquerda progressista e democrática.

Aliás, facto notório na comunicação de Renato Cardoso, como político, é a quase que completa ausência de fraseologia de esquerda marxizante e revolucionária da época em que viveu. Por isso, distinguiu-se na comunidade estudantil cabo-verdiana afecta ao PAIGC e nos grupos esquerdistas portugueses, como ideólogo de vulto e sui generis, pela sua defesa de uma política de esquerda mas democrática.



A este propósito convém lembrar que o léxico socialista/marxista revolucionário não fez parte notória da sua exposição escrita ou oral no debate" político.



Esta sua predisposição para 'resistir' à influência ideológica da esquerda marxizante, que ele considerava como retrógrada, fez com que sentisse um certo desconforto pela pressão que sofria na comunidade estudantil da esquerda totalitária, em Portugal.

As várias e por vezes violentas discussões que teve nos círculos estudantis, acerca de vários aspectos da cultura cabo-verdiana, consideradas "reaccionárias" pela liderança dos estudantes cabo-verdianos da esquerda revolucionária/socialista/marxista/totalitária, criaram entre ele e vários desses estudantes relações de tensão que persistiram no 'período' pós-independência; e em Cabo Verde recorda-se particularmente a sua posição quase que isolada de luta contra os que, por um revolucionarismo doentio, atribuíam um "carácter reaccionário" à morna e a certos autores da literatura cabo-verdiana, o que ele considerava como um ataque injustificável à própria identidade cabo-verdiana.



Esta sua demarcação ideológica da esquerda marxista (por definição, totalitária!) teve influências na sua carreira política: primeiro, como já o afirmámos antes, não teve posição de destaque na estrutura clandestina do PAIGC em Portugal, dominada pela esquerda marxista, apesar do seu destacável posicionamento como nacionalista, e mais ainda, da sua disponibilidade para acção e da sua grande capacidade de argumentação.



Esta situação de "contraste" entre a sua capacidade e posicionamento na estrutura política ficou bem evidenciada quando, apesar de ser um militante político de base, foi escolhido pela estrutura "partidária" para apoiar a delegação do PAIGC às negociações de independência em Portugal, em 1974, tanto como consultor técnico e como assessor político da delegação.



Mais tarde depois da independência, o contraste persistiu. Apesar da sua brilhante actuação como Director Geral dos Assuntos Políticos e Económicos do M.N.E. e do destaque como “leader” político da importante secção da Praia do PAIGC, o nome de Renato Cardoso não entrou na lista de possíveis candidatos à Comissão Nacional do PAIGC. Para essa situação contribuiu, para além da falta de "motivação" ideológica da parte dos seus camaradas de Portugal para apoiá-lo, as tensões e contradições que no entanto emergiram no seio do PAIGC, entre o grupo de Lisboa e a direcção vinda da "luta" do PAIGC, na Guiné. Para todos os efeitos Renato Cardoso era identificado com o grupo de Lisboa apesar de suas ligações com esse grupo terem sido fundamentalmente de natureza pessoal. Convém aqui fazer uma pausa para situar o posicionamento de Renato Cardoso no contexto da luta ideológica interna entre a "direcção da luta" vinda da Guiné e o grupo de Lisboa, vulgarmente associado à questão do trotskismo em Cabo Verde. Renato Cardoso não foi um comunista e muito menos trotskista. No entanto, já naquela altura era um político de visão moderna e nessa perspectiva altamente crítico das tendências de consolidação do que considerava práticas retrógradas do sistema de partido único: ascendência do partido sobre o Estado, que no seu entender facilitava a ascensão de medíocres; primazia aos quadros políticos e subalternização da capacidade técnica; paternalismo em relação à sociedade, gestão político-burocrática da cultura, etc.



Essas críticas eram também as críticas do grupo de Lisboa.

Os elementos de Lisboa fundamentalmente, levantavam a questão da política externa que, qualificavam de pró-imperialista ou, ou no mínimo, não suficientemente revolucionária e a questão da necessidade de mobilização naquilo que eles chamavam luta de classes e a natureza ideológica do PAIGC. Já essas questões não fizeram parte da base crítica da posição de Renato Cardoso em relação ao PAIGC. Daí que ele se posicionava como "crítico de dentro" da reforma, e não preconizava a mudança dita revolucionária à esquerda como propunha o grupo de Lisboa. A questão da liberdade de imprensa e sobretudo a do pluralismo político multipartidário neste período (1975- 1979) não eram ainda colocados. O grupo trotskista defendia, sim, o direito de tendência no seio do partido.



A sua diferença ideológica com o grupo de Lisboa não o "salvou" da conexão trotskista na visão da liderança do partido. Foi duramente criticado nas reuniões que se seguiram à ruptura no seio do PAIGC, em 1979, e acabou por ser afastado na prática, das estruturas do PAIGC. No entanto, convém frisar que as campanhas para sua depuração foram conduzidas principalmente pelas estruturas intermediárias e de base, particularmente inflamadas por alguns "quadros políticos do MNE, que identificavam a sua capacidade técnica e inteligência como ameaça séria à sua carreira no MNE e quiçá no PAIGC. A nível de cúpula do partido, particularmente do então Primeiro-ministro, o seu valor como quadro já era notado e apreciado. É assim que se compreende as várias contribuições analíticas a que era chamado a dar à comissão de organização e ideologia do PAIGC, à margem das estruturas formais do partido. O seu regresso de Portugal, depois de concluídos os estudos, vem marcar, uma nova fase na sua carreira política. Decididamente maduro, técnica e politicamente, continua a posicionar-se como homem de uma esquerda moderna, preocupado com questões sociais mas abertamente defensor da abertura política no seu lodo multipartidário. No entanto, neste período emerge um outro traço da sua personalidade política: um conhecedor e entusiasta das técnicas do exercício do poder e de liderança, isto é, um partidário da concepção da política como jogo. Desde sua passagem pelo Gabinete do então Primeiro-ministro, dois homens excepcionalmente inteligentes se encontram e se fazem amigos, com embates por vezes, descobrindo um chefe do Governo preocupado com a modernização do Estado de Cabo Verde e nesta perspectiva colabora com ele enquanto Secretário de Estado da Administração Pública. Renato Cardoso entendia que a modernização do aparelho do Estado, a sua gestão devia passar necessariamente pela reforma política imediata e consequente, isto é pela instituição do multipartidarismo político. Neste ponto sempre houve hesitações, que provinham, no fundo, das próprias contradições existentes no seio do PAICV na altura, no qual ainda não tinha conseguido vingar a tese de abertura política. O receio de novo pesava no seio dos militantes do PAICV, desde a base até ao topo, com nuances diferenciada, os interesses individuais eram muito escusos, e, por essas e outras razões, o debate no interior da máquina política do PAICV, foi sendo esbatido e protelado, vindo a acontecer, sensivelmente, cinco meses depois do assassinato de Renato Cardoso.





Vice-presidente da comissão preparatória das eleições para a Independência, em 1975; Director-Geral da Administração Interna; Director-Geral dos Assuntos Políticos, Económicos e Culturais do MNE; conselheiro do Primeiro-Ministro; Secretário de Estado da Administração Pública à data da sua morte.

Acumulou os cargos de presidente da Comissão Nacional de Estudos sobre o Direito do Mar; vice-presidente da Comissão Nacional para a CEDEAO; presidente do Grupo de Trabalho da Administração Pública para o II PND (Plano de Desenvolvimento Nacional); membro da Comissão de Reforma Administrativa; presidente do Conselho Científico e Pedagógico do Centro Nacional de Formação e Aperfeiçoamento em Administração, onde também foi professor.



Como diplomata, foi chefe da representação cabo-verdiana à Assembleia-geral da ONU, em 1975; tendo participado na mesma em anos posteriores; participou em várias conferências, a nível ministerial dos Não-Alinhados e desempenhou diversas funções diplomáticas a nível bilateral. Respondia, profissionalmente, como Diplomata-ministro plenipotenciário.

Solicitado, com frequência, a proferir conferências sobre relações internacionais e administração, em vários países estrangeiros. Publicou "Cabo Verde - Opção por Uma Política de Paz". Impulsionador activo da Reforma Administrativa, que considerava uma premissa necessária a um desenvolvimento equilibrado do país.

Foi homem da Música. Compôs canções de luta e de denúncia. Tocava guitarra e despertava simpatia pela simplicidade do seu modo de estar (consigo e com os outros).



Licenciado em Direito pela Universidade Clássica de Lisboa (onde foi monitor da cadeira de Finanças Públicas), profissionalmente tinha o estatuto de Diplomata-ministro plenipotenciário.



Secretário de Estado da Administração Pública desde 1986, de 1982 a 85 foi conselheiro do Primeiro-Ministro e coordenador do Serviço de Assessoria do Primeiro-Ministro. De 75 a 82 foi director-geral dos Assuntos Políticos, Económicos e Culturais do Ministério dos Negócios Estrangeiros; em 1975 desempenhou as funções de director-geral de Administração Interna, assim como as de Vice-presidente da Comissão Eleitoral que organizou as eleições para a Independência de Cabo Verde.

Desempenhou os cargos de presidente da Comissão Nacional de Estudos sobre o Direito do Mar, Vice-presidente da Comissão Nacional para a CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental), presidente do Grupo de Trabalho da Administração Pública para o IIPND. Foi membro da Comissão da Reforma Administrativa (1983-86), presidente do Conselho Científico e Pedagógico do Centro Nacional de Formação e Aperfeiçoamento em Administração, professor do Centro de Aperfeiçoamento em Administração.

Como diplomata, Renato Cardoso foi chefe da representação cabo-verdiana à Assembleia-geral de ONU, em 1975; participou na Assembleia-geral da ONU de 1976,77, 1980 e 81; interveio em várias conferências a nível ministerial dos Não-Alinhados e até ao presente desempenhou diversas acções diplomáticas a nível bilateral.

Para além do livro de ensaios de natureza política " CABO VERDE, UMA OPÇÃO DE PAZ", editado pelo Instituto Cabo-verdiano do livro e do Disco.



O Dr. Renato Cardoso deixou várias composições e, com Osvaldo Osório, subscreveu "Relance sobre a música e a poesia no processo cultural e revolucionário cabo-verdiano".



Eis por que homenageamos Renato Cardoso; o Homem, o Profissional. O político talvez, mas isso é outra história. Que será contada um dia. É o derradeiro intento para nos convencermos de vez de que Renato Cardoso já não existe. Porque a sua morte, até hoje é tão difícil de desvendar (?), é sobretudo, difícil de aceitar.

2 comentários:

  1. Gostei desta publicação. São muitas informações preciosas que todo Cabo-Verdiano deveria saber, mas que infelizmente não são ensinadas na Escola.

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  2. Precisamos de intelectuais cabo-verdianos conservadores dedicados aos valores judaico-cristãos, o socialismo nunca fez e nunca fará nenhum bem ao mundo, só pobreza, morte e desgraça.

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