domingo, 29 de agosto de 2010

Preâmbulo do livro "MARCAS LAMENTÁVEIS DA LUTA PELA DEMOCRACIA EM CABO VERDE".

"MARCAS LAMENTÁVEIS DA LUTA PELA DEMOCRACIA EM CABO VERDE", tira as dúvidas de uma vez para sempre de quem foram os mandantes do assassinato de Dr. Renato Cardoso; põe um ponto final no martírio das das viúvas e órfãos das vítimas do massacre em Santo Antão; abre o caminho para uma nova visão do entendimento sobre o assassinato de Amílcar Cabral e mostra com clareza quem foram realmente os protagonistas da democracia em Cabo Verde.
Além do mais, esclarece o processo sujo da independência de Cabo Verde, forjado pela direcção do Paigc/cv, junto dos comunistas portugueses.


MARCAS LAMENTÁVEIS
DA LUTA PELA DEMOCRACIA EM CABO VERDE 






Preâmbulo do livro (MARCAS LAMENTÁVEIS DA LUTA PELA DEMOCRACIA EM CABO VERDE). Será apresentado às 18:00H, do dia 31 de Agosto, na Biblioteca Nacional, pelo Dr. Lídio de Conceição Silva, bem como uma mensagem do Dr. Carlos Veiga dirigida aos malogrados do massacre de 31 de Agosto de 1981.


Preâmbulo


Um dos principais desafios que enfrenta a democracia Cabo Verde refere-se à produção equilibrada dos seus mais importantes atributos: a estabilidade política e a representatividade. Para um melhor entendimento conceitual, convém analisar a democracia como ideia e, por outro lado, como sistema de governo. A democracia como forma de governo consiste na democracia política e a democracia como ideia, pode ser caracterizada de forma genérica como um modo de vida - social ou moral.

A democracia é entendida como um regime político que melhor protege e promove os direitos humanos. É definida ainda, como regime fundado na soberania popular, na separação e desconcentração de poderes, com pleno respeito aos direitos humanos.

Esta breve abordagem procura agregar o conceito democracia política e democracia social; ou seja, reúne as liberdades civis, a separação e o controle sobre os poderes, a alternância e a transparência no poder, a igualdade jurídica e a busca da igualdade social, a exigência da participação popular na esfera pública, a solidariedade, o respeito à diversidade e a tolerância.

Pena não ser este o sistema que o povo Cabo-verdiano viveu desde o processo de Independência.

O golpe de Estado de 25 de Abril de 1974, em Portugal, pelo Movimento das Forças Armadas (MFA), determinou as condições necessárias para o exercício da democracia em Cabo Verde, circunstâncias essas aproveitadas de forma obscura, para o processo da Independência do País. A exclusão do PAIGC/CV dos outros actores políticos nacionais do processo da Independência Nacional, sujou este brilhante processo que tanto sonhara Amílcar Cabral.
Depois da tomada de posse do novo Governo Português da época, usando a autoridade conferida pela «Lei Constitucional n.° 3/74, de 14 de Maio» e nos termos do «decreto n.° 726/74 de 18 de Dezembro», o Presidente da República Portuguesa nomeou o «Alto-Comissário de Cabo Verde, o Comodoro Vicente Manuel de Moura Coutinho Almeida D'Eça» empossado na Cidade da Praia, no dia 31 de Dezembro de 1974, para conduzir o processo de transição, da Independência de Cabo Verde num período de seis meses.

Tomaram parte nesse acto o Senhor, Delegado do MFA, Major Hugo Santos, e o senhor, Vice-Secretário Geral ONU, Abu Farah.

Para além do Alto-Comissário, a parte portuguesa no referido governo foi ainda representada, em conformidade com o decreto n. ° 754/74, de 28 de Dezembro, «a parte portuguesa por dois ministros; e a cabo-verdiana por três ministros».
Depois da Independência em 5 de Julho de 1975, tendo à frente um único Partido, o PAICG/CV, pelas manobras feitas junto do Governo Português, elegeu-se a 30 de Julho de 1975, uma assembleia representativa do povo de Cabo Verde, constituída por 56 deputados. De acordo com os dados oficiais, 88,3% dos cidadãos recenseados (114.683) participaram no acto eleitoral, 92% dos quais votaram favoravelmente nas listas apresentadas, o que representava uma grande vitória para o PAIGC, que apresentou sozinho junto da população, pois os elementos das outras organizações políticas, por e simplesmente foram escorraçados.
Para a democracia, o abandono das instituições públicas onde os cidadãos são iguais é mais funesto que a má distribuição de rendas. Michael Walzer destaca que:

O princípio da igualdade está melhor servido não pela garantia da distribuição de rendas igualitárias, mas pela fixação de limites ao imperialismo de mercado que transforma os bens sociais em mercadorias. O dinheiro passa a ter domínio em outras esferas que não a económica. A igualdade civil e social sugere uma aproximação daquilo que seria a igualdade económica. (WALZER apud LASCH, 1985, p.31)

O eixo central da democracia é a ideia de soberania popular, a ordem política produzida pela acção humana. A ideia de democracia é tão vasta e tão plena que, não pode ser exemplificada por meio do Estado. Nenhuma forma de Estado, por melhor que seja, é suficiente para exemplificar a ideia de democracia em sua integridade. Isso porque a democracia, a sua realização transcende o Estado, ela encontra-se simultaneamente, em todos os modelos de associações humanas dentro da comunidade interagindo reciprocamente. Pode-se afirmar que a democracia compreende o respeito à legalidade, constituindo o chamado governo das leis, marcado pela subordinação do poder ao Direito. Esta concepção de democracia acentua a dimensão política na medida em que enfatiza a legitimidade e o exercício do poder político, avaliando quem governa e como se governa. Na acepção material, pode-se sustentar que a democracia não se restringe ao zelo pela legalidade, mas também, pressupõe o respeito aos Direitos Humanos. Não existe democracia sem o exercício dos direitos e liberdades fundamentais.

Mais que Estado de direito, a democracia advém dos clamores éticos de justiça e liberdade. A vida política seria, então, a tentativa de equilibrar decisões políticas e jurídicas (que favorecem as classes dominantes) e ao clamor moral social que defende o interesse das classes dominadas e minorias.

A democracia é um dos componentes da interacção social que transforma o Estado de Direito no interesse dos dominados, compensando a desigualdade social com os direitos morais. Taurine (1998) cita Locke, Rousseau e Tocqueville para mostrar que a democracia não resume a um apelo a igualdade abstracta de direitos, mas combate a desigualdade pelo acesso às decisões públicas. Uma sociedade será mais democrática na medida em que haja maior número de atores participando das decisões políticas.

O sistema político coloca-se entre o Estado e a sociedade civil, se há uma inclinação em favor do Estado, há autoritarismo; se for a favor da sociedade civil, há democracia, mas com o perigo de o ideal democrático se desligar do Estado. Para que a democracia desenvolva é necessário que haja ligação entre atores sociais e agentes políticos, que a representatividade social dos governados seja garantida e esteja associada à limitação dos poderes e a consciência da cidadania.

A democracia entendida como a busca da liberdade está apoiada na responsabilidade dos cidadãos. Da responsabilidade sobre os actos políticos nasce a representatividade. Os cidadãos devem reconhecer seus interesses nos actos do governo ou este será estranho e artificial à sociedade.

As minorias, numa sociedade democrática, devem ser reconhecidas como portadoras dos direitos universais e ao mesmo tempo, com direitos à luta pela afirmação e defesa da sua identidade. Esse tratamento dispensado pela maioria à minoria, carece de um espírito democrático - impor um comportamento, estabelecer seus limites de acção – é diferente de submeter direitos específicos aos universais. Esse tratamento pressupõe um reconhecimento de si e um reconhecimento do outro em suas diferenças e especificidades socioculturais, assim como, dos direitos universais do homem e do cidadão.

Como sobreviveria uma minoria que não lutasse pela defesa de sua identidade?

Provavelmente se descaracterizaria, se diluiria. Mas o que fazer quando há choque entre os direitos fundamentais e os direitos costumeiros da minoria? O que tem prioridade: ser um membro da minoria ou ser cidadão? A sociedade deve garantir o direito universal do cidadão, acrescido dos direitos específicos da minoria, ou seja, o direito à diferença, desde que estes direitos específicos não ultrapassem os direitos universais do homem e do cidadão, na construção de uma ‘sociedade à parte’, dentro da sociedade como um todo, formando guetos ou ilhas de comportamentos, suplantando o estado de direito inerente a todos.

A cidadania deve ser concebida como construção de sujeitos políticos, quase sempre em paradoxal processo de inserção em uma comunidade política. Esse paradoxo se delineia, ao mesmo tempo em que a construção de autonomia activa, como gozo da plena capacidade de intervir nos negócios da sociedade.

Longe da passiva visão do cidadão como portador autónomo de direitos, capaz de fazer opções racionais, pensamos o cidadão como parte de um colectivo em construção, sendo sua autonomia, a capacidade de forjar soluções e opções sociais. Esta concepção de cidadania entende que é necessário pensar a democracia num outro paradigma, que se centra na expansão da esfera pública e na construção de um novo pacto de poder, entre sociedade civil e agentes políticos.

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